quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Sair do Brasil para trabalhar já não é garantia de grana no bolso



O brasileiro desanima quando compara seu salário com os ganhos de trabalhadores de países desenvolvidos. Isso faz com que muita gente deixe o país e busque emprego no exterior. Mas numa situação de crise econômica nos EUA e na Europa, principalmente, ainda vale a pena se aventurar?

Hoje, o Brasil tem baixo índice de desemprego e estimativa de crescer 3,29% este ano. Já os países ricos estão com desemprego em alta e crescimento estagnado, em alguns casos até com situação de recessão. Esses são motivos que levam especialistas de Recursos Humanos a afirmarem que, hoje, as melhores oportunidades estão aqui. “O Brasil vive uma situação inversa, na qual brasileiros antes expatriados estão retornando e buscando emprego no país. E os estrangeiros têm visto no crescimento da economia brasileira uma oportunidade ante as crises na Europa enos EUA”, comenta o diretor geral no Brasil da multinacional de RH Manpower, Riccardo Barberis.

Pesquisa deste ano da Manpower mostra que, no Brasil, quase seis em cada dez empregadores têm dificuldade de preencher as vagas.

E quando trabalhar no exterior é um sonho ou necessidade profissional? Rachel Sciré, especialista em RH do ClickCarreira, portal focado no desenvolvimento profissional, lembra que há alternativas. “Algumas empresas,como a KPMG, SAP, Andrade Gutierrez e Rabobank, oferecem programas de trainee com vivência internacional, o que pode ser uma boa alternativa para ganhar experiência profissional fora do Brasil, sem correr os riscos de ser afetado pelo desemprego”, cita.

Ela destaca que o mercado de trabalho sempre vê a atuação internacional com bons olhos, mas a decisão deve ser bem calculada. “Quem tiver interesse em sair do país deve avaliar como a mudança poderá contribuir para a carreira, levando em conta a trajetória profissional e os planos para o futuro”, analisa.

A opção de trabalhar fora pode também incluir fatores como juntar dinheiro, aprender uma
língua e adquirir experiência. Mas os contras devem ser levados em conta. É importante antes
conhecer a situação do país que está na mira e se o emprego almejado tem estabilidade.



EUA prevê crescer 1,7% neste ano; o conjunto da Europa, abaixo de 1%

Censo: os 10% com os maiores salários no Brasil ganham 44,5% do total da renda



Endividamento em massa causou grave situação
A atual crise dos EUA e da Europa tem razões antigas. O Tratado de Maastricht, também conhecido como Tratado da União Europeia, de 1992, criou a integração econômica do continente. Ficava estabelecido que nenhum país poderia ter dívida interna maior que 60% do PIB (Produto Interno Bruto).

Só que isso não ocorreu, os governos gastaram muito mais do que arrecadavam, principalmente os países periféricos como Grécia, Irlanda, Portugal e Itália.

A criação do euro, em 1999, estabeleceu apenas a união monetária. Não houve união fiscal e política dos países. Mas, como as economias e bancos estão interligados, quando os países pequenos começaram a ter problemas para honrar suas dívidas, o continente inteiro sentiu o golpe.

No caso dos EUA, a grave crise de 2008 também veio de dívidas. Milhares de pessoas sem condições de pagamento tomaram crédito e bancos passaram a vender o direito de pagamento dessas dívidas. Isso foi possível porque o país tem poucas leis de regulamentação financeira, desde o governo de Ronald Reagan (1981-1989).

Atualmente a crise da dívida é mais grave na Europa, com países perto de realizarem calotes. A chanceler alemã, Angela Merkel, à frente do país mais rico da Europa, tenta conduzir reformas e ajudas aos vizinhos, mas o continente é extremamente complexo. São 17 parlamentos brigando por seus interesses.

A expectativa é que a Europa e os EUA continuem com baixo crescimento econômico por vários anos.

domingo, 20 de novembro de 2011

Oferta e demanda ‘manipulam’ custo de vida


Dentro do estado de São Paulo há cidades no Interior com o preço da cesta básica em R$ 156,54 (Bauru) e R$ 171 (Rio Preto/Jundiaí), diferença de 9%. Mas como o custo de vida pode variar assim entre cidades não tão distantes? A explicação técnica mais simples são as condições de oferta e demanda. E essas condições têm vários atores envolvidos que as “manipulam”.
                Entre os principais gastos de uma família há aqueles com preços fixados. No caso de transporte público, táxi, água e combustiveis temos a ação do Governo regulamentando as condições de oferta. Desta forma, as disposições contratuais afetam a oferta e as condições de precificação, podendo em alguns casos autorizar reajustes de preços que recuperem a inflação passada, ou seja, tenham maiores altas. “A administração pública local pode, portanto, autorizar mais ou menos licenças para taxis, pode subsidiar ou não os custos do transporte público, pode autorizar mais de uma empresa para fazer o saneamento público ou a distribuição de água”, diz a economista Cristina Helena Pinto de Melo, professora da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) e da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing).
                A localização geográfica é outro fator muito importante, já que interfere nos custos de transporte. Em algumas localidades não podemos produzir alguns dos bens consumidos. Desta forma, devemos adquirir esses bens de outras localidades. No Brasil os custos de transporte são muito significativos. “Estradas e combustível de qualidades ruins implicam em custos de manutenção e reposição mais rápida dos veículos encarecendo o transporte. Como alternativa para corrigir essas distorções, a cobrança de pedágios cria receitas para a manutenção das estradas, mas implica em custo de outra natureza. Trocamos um custo por outro”, comenta Cristina.
Trabalho
            A própria oferta de pessoas para trabalhar numa região é outro condicionante de vários preços. Estudos recentes, tais como o relatório Cities of Opportunity, da Consultoria PriceWaterhouseCoppers de 2010, associados com as informações de PIB (Produto Interno Bruto) e de população das cidades, bem como o City Development Strategies da UN-Habitat (United Nations Development Programme) indicam a importância das grandes metrópoles como pólos de crescimento, mas principalmente como centros agregadores de condições produtivas como mão de obra especializada.
            Concentrar mão de obra especializada ou centros de formação e mão de obra podem afetar os custos diretos de produção reduzindo ou ampliando os custos unitários e preços dos produtos.  A escassez de mão de obra tende a tornar os salários mais elevados tornando os custos e preços mais altos nos casos em que as empresas possuem algum poder de mercado e podem repassar esses custos ao consumidor.
            É notório que o Interior está se industrializando ou recebendo grandes pólos de varejo, empresas migram ou se instalam longe de grandes metrópoles para ter ganhos com menos impostos, aluguel e mais qualidade de vida. Mas isso também traz custos. Surge uma competição por contratar mão de obra, que cria o ambiente oportuno para observarmos o crescimento dos salários e o consequente repasse em toda a economia.
            Um exemplo comum dessa contaminação é o setor imobiliário. Maior população e maior renda implicam em mais lançamentos de imóveis, que podem ter seus preços elevados para se ajustar ao novo poder aquisitivo da população. Paralelo a isso, a oferta de imóveis também pode ser menor do que a procura, o que de novo aumenta preços. Por último, se o mercado está muito aquecido surge a especulação imobiliária.
            Saber quanto é o custo de vida de uma cidade é importante para fornecer às empresas parâmetros para definir os adicionais financeiros oferecidos aos empregados transferidos para uma localidade, bem como decidir se vale a pena ou não ter ou manter uma base em determinada cidade.
            Do lado do trabalhador, esse conhecimento é muito importante na hora de decidir uma mudança. “É correto sim afirmar que ao aceitar uma nova proposta de trabalho deva-se considerar não apenas os ganhos de salário, mas, também, o custo de vida da localidade. Escolas e alugueis mais baratos podem representar uma economia significativa e, portanto, um aumento no poder aquisitivo que equivale a um ganho de salário”, explica Cristina.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Educação emperra desenvolvimento do brasileiro, diz IDH


Neste ano, o Brasil subiu apenas uma posição no ranking de qualidade de vida e ainda tem pouco destaque na América Latina.

Segundo o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) divulgado ontem, o país ocupa a 84ª posição entre 187 países do mundo avaliados.

O Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) apontou que o Brasil tem neste ano o índice 0,718, numa escala que vai de 0 a 1.

O Brasil perde para países como Chile (44ª), Argentina (45ª), Uruguai (48ª), México (57ª) e
Panamá (58ª). O economista do Relatório de Desenvolvimento Humano do Pnud Brasil, Rogério Borges de Oliveira, comentou ontem que o país sofre com seu “passivo histórico”, por exemplo, por causa de sua colonização exploratória e longa escravidão. “Além disso, o Brasil é o único que tem dimensão continental e a maior população da América Latina. São fatores que tornam a evolução brasileira mais lenta”, disse.

DESIGUALDADE /Alémdo IDH, o Pnud começou também a medir neste ano a desigualdade dos países,um índice do desenvolvimento humano mais “real ”. Assim, descontando o chamado IDHAD (Índice de
Desenvolvimento Humano Ajustado à Desigualdade), o IDH do Brasil cai para 0,519, uma perda de 27,7%.

Com isso, o cidadão brasileiro médio tem quase 30% de risco de não conseguir alcançar o desenvolvimento humano potencial que o país tem para lhe oferecer. “Isso aparece em dados
de reprovação e abandono escolar ainda altos”, conclui Rogério.


Brasil aparece na lista de países de Desenvolvimento Humano Elevado

Mais de 5 milhões de pessoas vivem em situação de pobreza no Brasil


Desde 1980 índices melhoram
Segundo relatório do Pnud divulgado ontem, o Brasil avançou desde 1980 em quase todos índices
medidos: houve aumento na expectativa de vida no país (11 anos no período), melhora na média de anos de escolaridade (4,6 anos a mais), crescimento também da renda nacional bruta per capita com US$ 10.162 neste ano (quase 40% entre 1980 e 2011), mas a expectativa de anos
de escolaridade caiu de 14,1 para 13,8. A Pnud credita principalmente esses avanços à melhor cobertura na educação básica e aos programas de transferência de renda.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Financiamento da Saúde nos anos 2000: sobra dinheiro, mas não há vontade política para aplicá-lo

INTRODUÇÃO
Este presente trabalho analisa o financiamento da União para a Saúde, a legislação envolvida e em debate atual, os recentes orçamentos da pasta (a partir de 2000) e a política da DRU (Desvinculação de Receitas da União).

PROBLEMA
A saúde pública, quando da criação do SUS (Sistema Único de Saúde) em 1988, sinalizava iniciar um sistema público e universal no Brasil. Na prática isso não ocorreu e um dos principais motivos foi a falta de recursos financeiros adequados.
A União deve destinar ao setor o valor empenhado no Orçamento anterior acrescido da variação nominal do PIB (Produto Interno Bruto). Mas só que não há legislação estipulando a origem desses recursos e a Saúde sempre teve que “brigar” com outras prioridades do país ou foi prejudicada por políticas fiscais. O uso da DRU também vem retirando boa parte da arrecadação das contribuições sociais.
Pretende-se discutir as falhas da política de financiamento para a Saúde por parte da União.

DESCRIÇÃO
è Gastos proporcionais menores
Segundo o Tesouro Nacional, em 2010 na divisão de despesas executadas da União a Saúde gastou R$ 60.618.822.890,82 em valor nominal. Isso correspondeu a 5,4% de todas as despesas da União (R$ 1.115.572.064.820,96), ou seja, sem contar os gastos com refinanciamentos.
No ano de 2000, o gasto com Saúde foi de R$ 20.270.121.060,80, correspondendo a 6,4% do total de despesas liquidadas (R$ 315.420.658.792,34).
Para atualizar os valores das despesas da União, com base no IGP-DI de 2000/2011, usei como fonte no cálculo os dados de séries históricas do portal Ipeadata, que estabelecem agosto de 1994 = 100.
Dividi o valor atual do IGP-DI de 09/2011 (462,5090) pelo de 09/2000 (191,0490) e chega-se no valor de 2,4208920224654408031447429716984. Esse valor multiplicado pelo gasto da Saúde em 2000 dá R$ 49.071.774.370,49 atualizados.
O valor de 2010 atualizado é de R$ 65.133.129.880,40.
Pelos próprios dados oficiais vê-se então que as despesas totais da União aumentaram muito em dez anos, mas a Saúde não acompanhou esse ritmo. O valor atualizado gasto com a Saúde aumentou R$ 16 bilhões, mas caiu sua proporção em relação ao total das despesas executadas da União.

è Gastos em relação ao PIB “parados”
Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), os PIBs (Produto Interno Bruto) correntes foram de R$ 3,185 trilhões em 2009 (último apurado); e de R$ 1,179 trilhão em 2000.
O valor de gastos com a Saúde foi de R$ 57.084.559.191,12 em 2009, o que correspondeu a 1,79% do PIB.
O gasto com a Saúde em 2000 foi de R$ 20.270.121.060,80. Isso correspondeu a 1,72% do PIB.
Nota-se assim que a evolução desde 2000 foi muito lenta do gasto em relação ao PIB, apesar do grande crescimento da economia no período.
Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), em sua última pesquisa com dados relativos a 2008, o Brasil ocupa a 72ª posição mundial em investimento em saúde, quando a lista é feita com base na despesa estatal por habitante. A soma dos órgãos de governo brasileiro gasta uma média anual de US$ 317 por pessoa. O desempenho brasileiro é 40% mais baixo do que a média internacional (US$ 517).

è Criação pela metade
Essa falta de recursos para a Saúde no Brasil está ligada a falhas na criação dos sistemas públicos. O SUS e a Seguridade Social foram sistemas instituídos pela Constituição de 1988. Marques e Mendes (2011) mostram que o SUS foi “fruto direto da luta democrática ocorrida no país a partir de meados da década de 1970”. O chamado Movimento Sanitarista, que reunia profissionais de órgãos como da Fundação Oswaldo Cruz e Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, além de partidos políticos, sindicalistas, entre outros, exigiam uma mudança na saúde pública, que antes de 1988 era voltada apenas aos trabalhadores do mercado formal de trabalho e era financiada com recursos de contribuições calculadas sobre os salários.
A criação de um sistema público e universal de Saúde tinha o objetivo de atender milhões de pessoas e aumentar o conceito de cidadania no país, já que a própria Constituição passou a ter inscrita a frase: “A Saúde é um direito de todos e um dever do Estado”. Mas a criação do SUS não previu como ele seria financiado.
Em 1988, só estava determinado que os benefícios, ações e serviços da Previdência, da Assistência e da Saúde seriam custeados apenas por recursos vindos de contribuições sociais. Não foi aceito pela Constituinte determinar um percentual fixo de recursos à Saúde, tal como foi feito para a Educação.
O chamado Ato das Disposições Transitórias, criado emergencialmente na falta de aprovação de uma lei de custeio, no começo estabelecia que pelo menos 30% dos recursos da seguridade social iriam para a Saúde. Porém, com a pressão do aumento dos benefícios da Previdência esse percentual foi gradualmente caindo: 25% em 1992 e 15,5% em 1993. Essa situação levou em 1995 o presidente Itamar Franco a decretar estado de calamidade pública, o que possibilitou o Ministério da Saúde fazer empréstimos junto ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador).
Os problemas de caixa da Previdência Social foram aos poucos “isolando” os recursos da seguridade social, como aponta Marques e Mendes (2010):

Além disso, entre 1989 e 1993, houve especialização das fontes da Seguridade Social: os orçamentos destinaram a maior parte dos recursos do Cofins para a saúde, da CSLL para a assistência, e das contribuições de empregados e empregadores para a Previdência Social. Essa forma de utilizar as fontes de financiamento da Seguridade Social teve conseqüências, especialmente para a saúde.” (p. 276)

è 1994: dá com uma mão e tira com a outra – surge a DRU
Em 1994, após discussões do CNS (Conselho Nacional de Saúde) e da Comissão de Seguridade Social da Câmara dos Deputados, foi buscada uma solução para tentar minimizar a falta de recursos na Saúde. Foi criado o IPMF (Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira), com uma alíquota de 0,25%, que incidia sobre os débitos lançados sobre as contas mantidas pelas instituições financeiras. Em 1997, ele foi substituído pela CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira). A alíquota variou e chegou a 0,38%.
Mas, no mesmo ano de 1994, o governo federal criou um instrumento para usar o dinheiro das contribuições sociais em outros fins que não para a Seguridade Social. Foi criado o FSE (Fundo Social de Emergência), renomeado FEF (Fundo de Estabilização Fiscal) em 1997 e, finalmente, teve o nome de DRU (Desvinculação das Receitas da União) em 2000.
Segundo estudo da Anfip (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil), “Análise da Seguridade Social 2010”, publicado em 2011, a DRU “foi uma das várias medidas de ajuste fiscal preparatórias para o Plano Real”. Mas o que foi criado para ser transitório já dura 18 anos. Ela permite que 20% da arrecadação das contribuições sociais sejam desvinculadas de sua finalidade para uso do governo federal.
Cálculos da Anfip a partir de dados do Tesouro Nacional mostram que a DRU conseguiu desvincular em 2007, último ano que vigorou a CPMF, um total de R$ 38,5 bilhões em valores correntes das contribuições sociais. A receita da CPMF no mesmo ano foi de R$ 36 bilhões. Em 2010 a DRU conseguiu um total de R$ 45,8 bilhões desvinculados.
Atualmente os recursos vinculados à educação são preservados, não são incorporados à DRU, prática que se iniciou por meio da Emenda Constitucional 59/09. A Constituição determina que 18% do total de recursos arrecadados com impostos federais sejam destinados à manutenção e ao desenvolvimento do ensino.
Também ficam de fora da DRU as transferências constitucionais aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios oriundas de repartição de receitas, como os fundos de participação dos estados (FPE) e municípios (FPM).

è Emenda 29: esperança antiga
Durante os anos de desvinculação das verbas da seguridade social também houve uma boa notícia para as receitas da Saúde, apesar de sua efetividade ainda precisar de vontade política. Em outubro 2000 foi aprovada pelo Congresso a Emenda Constitucional 29, a qual definiu metas de receitas para a Saúde.
Segundo seu texto, para a União, para o primeiro ano de vigência, ficava definido o aporte de pelo menos 5% em relação ao orçamento empenhado do período anterior; para os anos seguintes, o valor apurado no ano anterior seria corrigido pela variação do PIB nominal. Para estados e municípios, no primeiro ano de sua vigência, eles deveriam alocar pelo menos 7% das receitas de impostos e transferências constitucionais, sendo que esse percentual deveria crescer anualmente até atingir, para os estados, 12% em 2004 e, para os municípios, 15%.
Mas até outubro de 2011 a Emenda 29 não havia sido regulamentada. Esse cenário agia como uma espécie de carro sem combustível, já que tirou a efetividade da emenda, como aponta Marques e Mendes (2011):

A EC 29 não explicita qual é a origem dos recursos e em relação à Seguridade é omissa, esquecendo toda a discussão realizada anteriormente e como não houvesse disputa pelos recursos da Seguridade Social.” (p. 11)

No dia 21 de setembro de 2011, após três anos de tramitação, o plenário da Câmara finalizou a votação do Projeto de Lei Complementar 306/08, que regulamenta quais despesas podem ser consideradas de saúde para estados, municípios e União atingirem o percentual definido pela Emenda 29. Mas como a matéria sofreu mudanças, ela voltou para o Senado. Não há previsão de votação.
Entre as mudanças, os deputados retiraram o dispositivo que obrigava o governo federal a aplicar no sistema de saúde 10% de suas receitas. Lideranças do Executivo já se manifestaram contrárias a essa obrigatoriedade para a União investir os 10%.

è Nova CPMF barrada
Ao mesmo tempo, ministros e lideranças do governo no Legislativo vêm declarando publicamente no ano de 2011 que um novo imposto para a Saúde precisa ser criado, reforçando um discurso que vem desde 2008.
O projeto 306/08 tinha também a definição da base de cálculo da CSS (Contribuição Social para Saúde), mas um destaque do DEM retirou isso do projeto. Os demais detalhes desse novo tributo continuam no texto, mas não será possível cobrá-lo por falta dessa base de cálculo.
A tentativa de criar um novo tributo nos moldes da CPMF para financiar a saúde ocorreu em junho de 2008, pouco antes de estourar a crise financeira nos Estados Unidos.
Antes da votação do destaque do DEM em 2011, o texto estabelecia que a CSS teria a mesma base tributária da CPMF, mas com uma alíquota de 0,10% e não mais de 0,38%. Cálculos do CNS (Conselho Nacional da Saúde) apontam que a arrecadação estimada da CSS seria de R$ 12,5 bilhões. Mas, como salienta Marques e Mendes (2011), ainda seria preciso subtrair desse valor 20% da DRU e os R$ 6 bilhões devidos ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (previsto no projeto).

è Prorrogação da DRU também é incerta
A DRU se extinguirá em 31 de dezembro de 2011, caso não seja prorrogada. O governo federal também vem encontrando dificuldades para votar isso no Congresso. A votação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 61/11 que prorroga a DRU até 2015 foi adiada para o dia 8 de novembro. Inicialmente, o objetivo dos governistas era votar o texto base em primeiro turno no dia 26 de outubro, deixando somente os destaques ao texto para o dia 8.
Segundo a Agência Câmara de Notícias, o líder do Governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP), negou que o adiamento tenha sido provocado por uma crise na base aliada por insatisfação com a liberação de emendas. Mas o noticiário político vem registrando que a bancada do PMDB, partido aliado do Planalto, está insatisfeita com a não liberação de emendas para os redutos eleitorais dos deputados. Outra insatisfação vem da bancada do Rio de Janeiro e do Espírito Santo com o projeto aprovado pelo Senado que trata da nova distribuição dos royalties do petróleo. Para aprovar a prorrogação da DRU são necessários 308 votos.
Há, no entanto, uma outra PEC sobre o assunto em tramitação no Senado – 81/11, do senador Romero Jucá (PMDB-RR). Essa manobra, nos mesmos termos da PEC 61/11, pode acelerar a aprovação da prorrogação da DRU. Ela está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado.
Além da pressão política por dinheiro, a aprovação da prorrogação da DRU também encontra uma resistência menor no Legislativo pelo fato de tirar recursos da Seguridade Social. O deputado Paulo Rubem Santiago (PDT-PE) defende que a prorrogação da DRU seja feita de forma a excluir o orçamento da Seguridade Social em quatro anos.
Santiago é autor da PEC 75/11, que propõe essa medida, e divulgou que seu partido apresentou destaque para retirar da PEC principal, 61/11, de autoria do governo, a seguridade, caso sua PEC seja desconsiderada. Segundo ele, a DRU não tem qualquer efeito benéfico, diminui a transparência dos gastos e retira recursos de áreas como a Saúde e a Previdência.

ANÁLISE
O próprio ministro da Saúde, Alexandre Padilha, afirmou no dia 20 de setembro de 2011, em comissão geral na Câmara para debater a regulamentação da Emenda Constitucional 29, que o Brasil precisa investir mais R$ 45 bilhões por ano para universalizar a Saúde. Ele defendeu que esse montante daria mais qualidade ao atendimento na área e equipararia o serviço de saúde brasileiro ao de outros países sul-americanos, como o Chile e Argentina.
Coincidência ou não, em 2010 a DRU teve um total de R$ 45,8 bilhões desvinculados, quase o mesmo valor apontado pelo ministro como necessário para a Saúde.
Piola (2009), em citação de Marques e Mendes (2011), aponta que a União não vem respeitando a Emenda 29, que manda investir o valor apurado no ano anterior corrigido pela variação do PIB nominal:

No caso da União, a diferença entre o valor mínimo previsto e o valor efetivamente aplicado, entre 2000 e 2008, chega também a R$ 3 bilhões. Se a isso se soma montante cancelado de Restos a Pagar, de R$ 2,6 bilhões, e se os gastos registrados indevidamente como SUS forem subtraídos, tais como Bolsa Família, ações e serviços de saúde para servidores e Farmácia Popular, a diferença atinge R$ 6 bilhões.” (p. 13)

Segundo a Anfip, a receita das contribuições sociais em 2010 foi de R$ 229,2 bilhões, mas muito disso não foi para gastos públicos. As receitas superaram as despesas em R$ 58 bilhões.
O dinheiro “sugado” pela DRU vai para o cumprimento das metas fiscais do país. As aprovadas na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) para 2012 são duras, apesar de terem sido um pouco amenizadas depois pelo Executivo. Na aprovação do Congresso havia ficado estabelecida uma nova meta fiscal para o setor público consolidado não financeiro (União, estados e municípios, e suas estatais não financeiras): o deficit público nominal – receita menos despesas, incluindo juros - do próximo ano não poderá ultrapassar 0,87% do PIB.
Na prática, isso significa que o resultado de tudo o que o governo arrecada menos os juros e as despesas precisa ser menor do que 1% de todas as riquezas que o País produzirá em 2012. No ano passado, esse percentual ficou em 2,6%. Ou seja, conforme foi aprovado pelo Congresso, o País precisaria economizar cerca de três vezes mais para ter o saldo dentro da meta.
A meta de superavit primário ficou em R$ 139,8 bilhões para o setor público consolidado. Valor que pode ser reduzido em R$ 40,6 bilhões, relativos aos projetos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). O projeto original do governo permitia um número maior de abatimentos, que foram retirados do texto pelo relator.
No entanto, a presidente Dilma Rousseff sancionou a LDO com alguns vetos, apesar de manter a meta de superavit primário de R$ 139,8 bilhões. Foram vetados a meta para o deficit nominal de 0,87% e um artigo da LDO que previa a reserva de verba do orçamento do ano que vem para reajustes acima da inflação para os aposentados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). O artigo previa que tais reajustes seriam definidos com as centrais sindicais e os representantes da iniciativa privada.
O superavit primário de 2011, segundo anunciou em agosto o ministro da Fazenda, Guido Mantega, será de R$ 127,9 bilhões, ou 3,3% do PIB. O discurso do governo é que o superavit primário é uma economia feita para pagar juros da dívida pública e manter sua trajetória de queda. O benefício apontado dessa política econômica seria estimular a redução dos juros básicos da economia.
Mas e como fica a Saúde? O Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), no estudo “Políticas Sociais: acompanhamento e análise - Vinte Anos da Constituição Federal” (2009), fez uma grande análise sobre a Seguridade Social. Na Saúde foi apontado que o "subfinanciamento restringe a capacidade de financiamento do sistema público, sua capacidade de oferta e organização de uma rede resolutiva". Essa situação é ainda mais grave para as famílias de baixa renda:

Isto resulta em ônus para as famílias, que precisam destinar parte importante do orçamento familiar a despesas com saúde. O gasto familiar com assistência à saúde consome, em média, 5,3% da renda das famílias. Entre os mais pobres, chega a consumir 7,1% da renda, enquanto consome 4,5% da renda dos mais ricos. Nas famílias de menor renda, o gasto com medicamentos representa quase 80% das despesas com assistência à saúde.” (p. 151)

Sobre a regulamentação da Emenda 29, que encontra pressão contrária do Executivo e Legislativo para finalmente ser aprovada, o Ipea também mostra que na verdade as propostas sugeridas, como a de 10% das receitas como gasto mínimo, não representariam uma despesa tão elevada assim para o governo e nem atenderiam todas as necessidades da Saúde:

Uma das alternativas em jogo [propostas de regulamentação], o aporte mínimo de 10% da receita corrente bruta da União como forma de participação desta no financiamento do SUS, representaria um acréscimo de recursos equivalente a cerca de 1% do PIB. Recorde-se que, ainda com esta proposta, considerada a mais atraente para a saúde, o gasto público não chegaria a 5% do PIB. A definição legal do que pode ser considerado como despesa com ações e serviços públicos de saúde também poderia reforçar o aporte de recursos. Apesar de todos os esforços, o volume de recursos alocados à saúde poderia ainda ficar aquém das necessidades, mas ao menos aproximaria o Brasil do padrão de outros países com sistemas de saúde de acesso universal.” (p. 151)

Vale citar que a regulamentação parcial da Emenda 29 já aprovada na Câmara, como já escrito anteriormente, pelo menos já estabeleceu quais despesas podem ser consideradas de saúde para estados, municípios e União atingirem o percentual definido pela emenda. Isso sem dúvida foi um avanço, pois a União, os estados e os municípios, por falta de definição legal do que deve entender-se como gastos em ações e serviços públicos de saúde, para efeito de cumprimento da emenda, têm incluído gastos que são questionados pelo CNS e Ministério Público; por exemplo, gastos com previdência social de servidores públicos do setor, saneamento, entre outros.
O texto aprovado lista 12 despesas que devem ser consideradas como relativas a ações e serviços públicos de saúde; e outras dez que não podem ser custeadas com os recursos vinculados pela Emenda 29.
Entre as ações permitidas estão a vigilância em saúde (inclusive epidemiológica e sanitária); a capacitação do pessoal do SUS; a produção, compra e distribuição de medicamentos, sangue e derivados; a gestão do sistema público de saúde; as obras na rede física do SUS e a remuneração de pessoal em exercício na área.
Por outro lado, União, estados e municípios não poderão considerar como de saúde as despesas com o pagamento de inativos e pensionistas; a merenda escolar; a limpeza urbana e a remoção de resíduos; as ações de assistência social; e as obras de infraestrutura.
E outro ponto polêmico no financiamento da saúde pública são os planos de saúde. Por meio de renúncia fiscal, as pessoas físicas têm o direito de deduzirem da renda tributável o que gastaram com assistências médica e odontológica, para fins de IR (Imposto de Renda). Esta alcança também as empresas privadas quando prestam assistências médica e odontológica a seus empregados e familiares diretamente ou, o que é mais frequente, quando subcontratam operadoras no mercado. Em segundo lugar essa relação com a saúde privada em que há dispêndio público, ocorre quando o SUS atende, sem ser ressarcido por isso, pacientes portadores de planos de saúde. E, finalmente, quando o Estado brasileiro oferece subsídios para que seus servidores, por meio de diferentes arranjos institucionais, contratem coletivamente planos de saúde, contribuindo para a expansão do mercado deste segmento.
Como aponta o Ipea, esse incentivo para a saúde suplementar com recursos públicos ajuda seus usuários a encontrarem presteza e garantia de atendimento oportuno no acesso rápido a especialistas e exames de diagnose e terapia. Por outro lado, o usuário do SUS, excluídas as situações de urgência ou emergência, quase sempre enfrenta dificuldades e demoras para obter certos atendimentos simples e acesso a alguns serviços de média complexidade.

CONCLUSÕES
            Desde a criação do SUS por meio da Constituição de 1988 todos os governos federais que vieram não foram bem sucedidos em estabelecer de fato um sistema público e universal de Saúde no Brasil.          
            O país tem uma despesa estatal por habitante que ocupa apenas a 72ª posição mundial segundo a OMS. No quesito financiamento faltam legislações adequadas desde 1988, já que a criação do SUS não previu até hoje a fonte de seus financiamentos. O Executivo e o Legislativo deixaram essa prioridade de lado.
            Nos anos 2000, mesmo com o maior crescimento econômico e alta da arrecadação, caiu a proporção dos gastos para a Saúde em relação ao total das despesas executadas da União e o gasto em relação ao PIB avançou pouco de 2000 para 2009, de 1,72% para 1,79%.
            Na organização orçamentária brasileira a Saúde recebe verbas da União por meio de recursos das contribuições sociais, mas tem que dividir o dinheiro com outras ações não menos importantes da Seguridade Social: Previdência e Assistência.
            E essa situação ficou ainda pior com a criação da DRU em 1994. Esse instrumento de desvinculação orçamentária vem servindo para propósitos de metas fiscais, principalmente o aumento dos superavits primários. Assim, a Saúde tem menos dinheiro para aumentar seus gastos anuais.
            Uma tentativa de organizar, disciplinar e ampliar os gastos com a Saúde foi a Emenda 29, aprovada em 2000. Mas, de novo, faltou vontade política para sua efetivação. Até hoje a medida aguarda regulamentação final. Como está hoje, a emenda prevê que os gastos do governo federal com saúde acompanhem a expansão da economia e sejam reajustados todo ano de acordo com a variação do PIB. Portanto, faltam pontos cruciais: estabelecer tipos de vinculação das receitas da União com o setor, normatizar o que pode e o que não pode ser considerado gasto com a Saúde e definir o quanto das receitas da União será obrigatório usar por ano. Apenas o segundo item foi votado pela Câmara, mas ainda precisa ser aprovado pelo Senado. Os outros enfrentam pressão do Executivo.
O argumento das equipes econômicas dos governos federais desde o Plano Real (1994) é que o superavit primário ajuda a reduzir os juros básicos da economia. Mesmo assim, o Brasil mantém até hoje a liderança mundial dos juros reais (taxa nominal descontada a inflação projetada para os 12 próximos meses), com 5,5% ao ano.
Um país em desenvolvimento como o Brasil e com várias desigualdades é claro que possui diversas prioridades. Na questão da Saúde, como mostrado, existe sim dinheiro desvinculado pela DRU que poderia ajudar a diminuir em muito suas deficiências. Além disso, o fim ou diminuição dos incentivos para a saúde suplementar e a regulamentação adequada da Emenda 29 poderiam tornar o financiamento da saúde pública também mais robusto. Essas são informações que deveriam estar mais no debate público para a população e Congresso fazerem melhor suas escolhas.
O que não é aceitável é o fisiologismo no Congresso. Atualmente, interesses de toda a população como a Emenda 29 ficam ameaçados pela negociação de emendas parlamentares. Outro erro é deixar o foco do debate político apenas centrado na criação de um novo imposto para saúde, quando na verdade boa parte dos recursos já existem, basta vontade política para usá-los.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Dados de inflação do Portal Ipeadata: http://www.ipeadata.gov.br/

Dados de despesas da União do Tesouro Nacional: http://www.tesouro.fazenda.gov.br/estatistica/est_contabil.asp

Noticiário da Agência Câmara de Notícias: www2.camara.gov.br/agencia